Profissionais da Saúde


Regiões anatômicas e prognósticos


A cavidade bucal está dividida nas seguintes áreas:



• Lábios;

• 2/3 anteriores da língua;

• Mucosa jugal;

• Assoalho da boca;

• Gengiva inferior;

• Gengiva superior;

• Área retromolar;

• Palato duro.



Todas as áreas apresentam drenagem linfática para o pescoço, sendo que a primeira estação de drenagem inclui os linfonodos júgulo-digástricos, júgulo-omo-hioideos, submandibulares e submentonianos (ou seja, níveis I, II e III). Linfonodos do segundo escalão de drenagem são os parotídeos, os jugulares e os cervicais posteriores (superiores e inferiores).
      A maior parte dos tumores malignos da cavidade bucal é constituída pelo carcinoma epidermóide, que se classifica em: bem diferenciado, moderadamente diferenciado e pouco diferenciado.
     Embora apresentem menor incidência, deve-se citar outros tipos de tumores que podem ocorrer na cavidade oral, tais como: os tumores salivares (das glândulas salivares menores e da sublingual), os sarcomas (os de origem vascular, os musculares e os ósseos) e o melanoma de mucosa.
    O prognóstico de pacientes com câncer de cavidade oral depende da área da cavidade oral comprometida e do estadiamento do sistema TNM (Classificação de Tumores Malignos). As lesões situadas nas porções mais anteriores e as lesões iniciais (I-II) têm um prognóstico melhor em comparação com as lesões avançadas (III - IV).



Figura 1 - Sobrevida em relação ao estadiamento





Diagnóstico


Exame físico

O exame de toda a cavidade bucal deve ser feito de maneira metódica para que todas as áreas sejam analisadas e seja possível a identificação de próteses dentárias ou outras prováveis causas de trauma contínuo. As lesões mais posteriores da cavidade bucal, por vezes, necessitam de visualização com o auxílio de instrumentos ou por espelho para a avaliação de sua extensão. As lesões, sempre que possível, devem ser palpadas, a fim de se confirmar seus reais limites e o acometimento de estruturas adjacentes. A palpação das cadeias linfáticas cervicais completará o exame, sendo importante a determinação do tamanho dos linfonodos, sua mobilidade e relação com estruturas vizinhas.



Ao ser identificado o tumor, é importante registrar suas dimensões e características: se é ulcerado, infiltrativo, necrosado, com infecção secundária, se ultrapassa a linha média, se há indícios de invasão óssea e/ou da musculatura profunda. A presença de leucoplasias, eritroplasias e possíveis lesões pré-neoplásicas simultâneas devem ser investigadas. O trismo, quando presente, pode ser decorrente da invasão tumoral da musculatura pterigóidea ou por dor local. Exames de imagem (como a tomografia computadorizada ou a ressonância magnética) são importantes nesses casos, mas, às vezes, só o exame sob narcose, no centro cirúrgico, vai esclarecer essa dúvida.
Após meticuloso exame da cavidade oral, parte-se para o exame endoscópico do cavum e a videolaringoscopia, a fim de avaliar possível prolongamento do tumor para essas áreas ou diagnosticar a presença de um segundo tumor primário.
Biópsia da lesão

Biópsia incisional que, dependendo da facilidade de acesso, pode ser feita por pinça de saca-bocado sob anestesia local. A punção aspirativa por agulha fina (PAAF) é indicada naquelas lesões infiltrativas subjacentes à área de mucosa normal.
Extensão da doença - Sistema de estadiamento

São avaliações clínico-radiológicas baseadas na melhor determinação possível da extensão da lesão antes do tratamento. Essa avaliação clínica é baseada na inspeção da lesão e, quando possível, palpação da mesma, assim como por exame endoscópico indireto ou direto, quando necessário. A avaliação radiológica será complementar, mostrando comprometimento ósseo e/ou infiltração de partes moles. As áreas de drenagem devem ser examinadas por palpação cuidadosa.
Estudo radiológico

Quando indicado, faz-se o estudo radiológico panorâmico da mandíbula (avaliação de acometimento ósseo), Raios X simples (RX) de seios da face (lesões de palato duro) e, rotineiramente, RX de tórax (pesquisa de metástases à distância).
Exames de exceção

A tomografia computadorizada e o exame de ressonância magnética são procedimentos de exceção, devendo ser usados para avaliação da extensão da lesão nos casos em que o exame clínico não seja suficiente, ou quando o tamanho do tumor ou o status dos linfonodos cervicais puserem em dúvida a operabilidade ou a extensão da cirurgia a ser proposta.


Exames pré-operatórios

• Hemograma completo e coagulograma;

• Eletrocardiograma;

• Risco cirúrgico (apenas em pacientes com idade maior do que 40 anos ou com patologias prévias);

• Proteínas totais (pacientes desnutridos);

• Função hepática (bilirrubinas e transaminases) nos alcoólatras;

• Dosagem sangüínea de eletrólitos (Na+ e K+) nos pacientes com dificuldade alimentar (desidratados) ou aqueles que fazem uso crônico de diuréticos.
Suporte pré-operatório

Uma equipe multidisciplinar é fundamental no pré-operatório. Todos os pacientes são encaminhados para o Serviço de Odontologia, onde é feita a higienização oral, e para o Serviço de Nutrição, onde se avalia a necessidade de sonda nasoenteral para maior suporte calórico.
A enfermagem fica responsável pela orientação, assim como pela troca do curativo no pós-operatório mediato, após alta hospitalar.
A psicologia é de fundamental importância no manejo tanto pré como pós-operatório, tendo em vista que o câncer é acompanhado de transtornos psicológicos dos mais diversos e que as seqüelas das cirurgias muitas vezes implicam em perda do convívio social. Os alcoólatras ou aqueles pacientes que serão submetidos a grandes ressecções com reconstruções complexas também serão encaminhados aos Serviços de Psicologia e/ou Psiquiatria.
A fisioterapia respiratória ambulatorial pré-operatória fica destinada aos pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica grave (DPOC).
A importância do fonoaudiólogo está em tentar minimizar os defeitos de fala e deglutição provocados pelas alterações cirúrgicas, assim como na diminuição do tempo para decanulização traqueal, com o objetivo de facilitar a introdução dos pacientes em seu meio social.


Fonte: Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço – Rotinas Internas do INCA-adaptada
 
Classificação de Tumores Malignos (TNM)
Como Diagosticar
 
 
Tratamento


Dependendo do local, da extensão do tumor primário e do status dos linfonodos cervicais, o tratamento do câncer da cavidade bucal pode ser cirúrgico, radioterápico ou uma combinação de ambos. A cirurgia para ressecção dos tumores primários deve incluir sempre toda lesão tumoral e margem de tecido livre de tumor em todas as dimensões (mínimo de 1,0cm de margem), sempre confirmada no ato cirúrgico por exame de congelação.

A radioterapia de lesões extensas deve incluir também as cadeias de drenagem linfáticas, mesmo quando, clinicamente, estas não estiverem acometidas. A dose para o sítio primário varia de 65Gy a 75Gy, durante cinco a sete semanas.

Assim, as opções de tratamento irão variar de acordo com o estádio clínico das lesões. Por conseguinte, teremos:


Estádio I (T1 N0 M0)

O tratamento preferencial é cirúrgico, o qual corresponde à ressecção de lesão com margens de pelo menos 1,0cm. Em casos de lesões localizadas na língua, deve-se associar, ao tratamento do tumor primário, o esvaziamento cervical supra-omo-hióideo, em virtude do alto índice de metástase cervical oculta. Nos casos de lesões em assoalho de boca, a indicação de esvaziamento cervical eletivo vai depender do caráter infiltrativo da lesão.

Em pacientes com metástase cervical, deve-se associar, ao tratamento do tumor primário, o esvaziamento cervical radical modificado quando houver apenas um linfonodo metastático e sem extravasamento capsular. Nos casos de mais de um linfonodo metastático ou extravasamento capsular, realiza-se o esvaziamento cervical radical.



Transoperatório

• A anestesia do paciente deve ser feita, preferencialmente, via entubação nasal. Deixar a traqueostomia, se necessária, para ser realizada com o paciente já anestesiado;

• Avaliar a real necessidade da traqueostomia em lesões bem anteriores de borda de língua sem ressecções ósseas; casos em que o edema pós-operatório esperado é mínimo;

• O ato cirúrgico é iniciado pelo esvaziamento cervical;

• Se não houver comunicação orocervical, fazer o fechamento do pescoço antes de partir para o segundo tempo cirúrgico (cavidade bucal). Os instrumentais cirúrgicos utilizados em cada tempo devem ser diferentes;

• Colher cultura prévia nas lesões infectadas da boca;

• A antibioticoprofilaxia é feita com o uso da cefazolina por 24 horas;

• Nos casos de sutura oral extensa, ao fim do procedimento, instalar sonda nasoenteral (SNE) nº 12.


Pós-operatório

• Troca diária de curativo e avaliação da cavidade oral com fotóforo;

• Iniciar a decanulização traqueal o mais breve possível, de forma que o paciente tenha alta hospitalar sem a traqueostomia. A cânula de traqueostomia com "cuff" é trocada pela cânula metálica nº 6 no primeiro dia de pós-operatório (DPO);

• Dieta pela SNE no primeiro DPO (após checar posicionamento da sonda com RX de abdômen);

• Fisioterapia respiratória e motora;

• Higiene oral rigorosa com cepacaína;

• Avaliar uso de corticóides quando houver grande edema;

• Retirada dos drenos no terceiro DPO e alta hospitalar no terceiro ou quarto DPO (de acordo com o débito da drenagem: 30ml/12 horas - 50ml/24 horas).


Estádio II (T2 N0 M0)

O tratamento preferencial é cirúrgico, com ressecção da lesão com margens de pelo menos 1,0cm. Nos casos de tumores localizados na língua ou assoalho da boca, associar, ao tratamento do tumor primário, o esvaziamento cervical eletivo supra-omo-hióideo.
Nos casos de pacientes com metástase cervical, realizar também o esvaziamento radical modificado quando houver apenas um linfonodo metastático e sem extravasamento capsular. Nos casos de mais de um linfonodo metastático ou extravasamento capsular, incluir, no tratamento cirúrgico, o esvaziamento cervical radical.

Os cuidados trans e pós-operatórios são os mesmos descritos para o Estádio I.


Estádio III (T3 N0 M0 e T1, T2 ou T3 N1 M0)

A cirurgia é o tratamento preferencial e consiste de ressecção completa da lesão com margens de no mínimo 1,0cm, associada ao esvaziamento cervical supra-omo-hióideo em casos de pescoço clinicamente negativo. Nos casos de pacientes com metástase cervical, associar o esvaziamento radical modificado quando houver apenas um linfonodo metastático e sem extravasamento capsular. Nos casos de mais de um linfonodo metastático ou extravasamento capsular, realizar o esvaziamento cervical radical.
A radioterapia deve ser usada como tratamento complementar em casos de pescoço positivo com múltiplos linfonodos, extravasamento capsular, invasão angiolinfática e/ou perineural, doença residual microscópica ou lesão primária T3.
Transoperatório

Preferencialmente, o acesso cirúrgico deve ser transoral; porém, em pacientes com grandes tumores, a incisão médio-labial com prolongamento cervical pode ser uma boa opção.

Quando se pretende realizar esvaziamento cervical bilateral, o acesso tipo retalho em "viseira" oferece uma excelente exposição, principalmente em tumores de língua oral com invasão de assoalho e arco central da mandíbula, permitindo assim a mandibulectomia e retirada da peça cirúrgica em monobloco. Este retalho é feito por uma incisão em "U" bimastóidea, preservando a integridade do lábio e permitindo ao cirurgião uma ótima exposição cirúrgica, com resultado estético bastante aceitável. Tem por inconveniente a secção bilateral dos nervos mentonianos.



Os cuidados pós-operatórios são os mesmos descritos nos estádios anteriores.



Estádio IV (T4 N0 ou N1 M0/qualquer T N2 OU N3 M0/qualquer T/ qualquer N/ M1)

A cirurgia é o tratamento preferencial, consistindo de ressecção completa da lesão com margens de no mínimo 1,0cm e associada ao esvaziamento cervical supra-omo-hióideo em casos de pescoço clinicamente negativo.

Nos casos de pacientes com metástase cervical, associar o esvaziamento radical modificado quando houver apenas um linfonodo metastático e sem extravasamento capsular. Nos casos de mais de um linfonodo metastático ou extravasamento capsular, realizar o esvaziamento cervical radical.

A mandíbula poderá ser preservada parcialmente (mandibulectomia marginal) nos casos de invasão óssea mínima ou de acometimento apenas do periósteo. Caso contrário, com invasão óssea grosseira, proceder à mandibulectomia segmentar ou hemimandibulectomia.

A radioterapia deve ser usada como tratamento complementar. A radioterapia como terapia exclusiva pode ser indicada em pacientes considerados inoperáveis, porém com objetivo apenas de paliação.

O paciente deve ser preparado para diversos tipos de retalhos. O mais utilizado, no Instituto Nacional de Câncer, em tumores T3 e T4, é o retalho nasogeniano com pedículo inferior para a reconstrução do assoalho bucal anterior e/ou lateral.

Para pequenos defeitos, na área retromolar ou mucosa jugal, são utilizados retalhos de língua (ilhados ou pediculados). Para grandes defeitos, em cirurgias em que a participação da equipe de microcirurgia não seja possível, utilizar o retalho miocutâneo de grande peitoral.

O retalho frontal de McGregor, embora atualmente pouco utilizado pelo defeito estético produzido, é eficaz na reconstrução do palato, da mucosa jugal e da parede lateral da orofaringe. Para as reconstruções ósseas microcirúrgicas, as principais opções são os retalhos de crista ilíaca (perdas látero-superiores) e o de fíbula, que fraturado e moldado se adeqüa muito bem às reconstruções do arco central da mandíbula.

Não se utilizam placas de titânio para a reconstrução isolada de grandes perdas ósseas, a não ser quando a placa possa ser muito bem protegida por grandes retalhos musculares e, mesmo assim, o risco de exteriorização da placa após a radioterapia é muito alto. As placas de titânio de fixação são usadas para osteossíntese nos retalhos ósseos microcirúrgicos.

Em pacientes com defeitos no andar superior da boca, são utilizadas próteses obturadoras ou mesmo o retalho nasogeniano invertido com pedículo superior.
Tumores do lábio

O tumor maligno mais freqüente é o carcinoma epidermóide da mucosa labial. É uma área da cabeça e pescoço que gera várias controvérsias, quer seja no tipo de reconstrução ou na indicação do esvaziamento cervical eletivo em pescoço negativo.

De maneira geral, o tipo de reconstrução vai depender da experiência do cirurgião. Os retalhos mais utilizados no INCA são:

a) Para tumores pequenos: os retalhos em "V", em V-Y, o de Abbe e a vermelhectomia com avanço mucoso;

b) Para reconstrução da comissura labial: o retalho de Abbe-Estlander;

c) Para tumores de lábio superior: os retalhos nasogenianos;

d) Para tumores maiores: os retalhos de Karapandzik e de Gillies, o retalho de avanço da bochecha de Webster e até mesmo os retalhos microcirúrgicos (sendo o retalho antebraquial ou chinês o mais utilizado).

O esvaziamento cervical em pescoço negativo do tipo supra-omo-hióideo está indicado em pacientes com tumores T3 ou T4, tumores agressivos (carcinomas indiferenciados), tumores recidivados e, dependendo do caso, tumores da comissura labial e do lábio superior, onde a chance de metástase cervical oculta é maior.

Fonte: Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço – Rotinas Internas do INCA


Carcinoma Epidermóide da Cabeça e Pescoço